A transição democrática brasileira, ainda em curso, tem esbarrado na enorme dificuldade em inserir a atuação penal nesse paradigma político. Mais do que isso, os limites ao processo de democratização, demarcados na atuação desse setor estatal, nos remete à idéia de que o campo jurídico ficou imune às mudanças democráticas. Mesmo que o discurso corrente entre os profissionais do Direito afirme a democratização da Justiça Penal, observa-se, na prática, uma forte resistência do campo jurídico em assumir a sua responsabilidade política na consolidação democrática. Este artigo reporta análises e conclusões formuladas a partir de observações sobre a Justiça Penal brasileira e que deram origem à tese intitulada "Justiça Penal no Brasil atual: discurso democrático - prática autoritária". O objetivo dessa pesquisa foi refletir sobre a política criminal contemporânea, voltada à ampliação da repressão e ao uso contínuo do encarceramento. Tal política, realizada no Brasil logo após a abertura política, ocorrida em 1985, ajustase ao projeto liberal também em curso no país e em praticamente todo o Ocidente capitalista. Como pode ser observado, a Justiça Penal, mesmo durante a execução da pena, opera de forma autoritária e excludente, ao suprimir ao máximo os direitos previstos em lei para os condenados, adotando uma postura altamente repressiva, revelada pelos ínfimos percentuais de benefícios concedidos. No Brasil, as respostas à criminalidade consistem, portanto, em sua grande maioria, em penas severas, traduzidas na ausência do respeito às garantias constitucionais e no recurso amplo ao encarceramento. Nessa linha, nossos governos democráticos contemporâneos freqüentemente adotam uma posição punitiva que visa reafirmar a aptidão do Estado em punir e controlar a criminalidade.
The Brazilian democratic transition, still underway today, has run up against enormous difficulty in incorporating penal action. Or, put in yet stronger terms, we could say that the boundaries of democratization processes, delineated through the action of that sector of the State, reveal the possibility that the juridical field remains immune to democratizing change. Although prevailing discourse among law professionals asserts that Penal Justice is undergoing democratization, what we have observed in practice is a strong resistance within the juridical field to assuming political responsibilities within the consolidation of democracy. This article reports analyses and conclusions formulated through observation of the Brazilian penal justice system that gave origin to the thesis entitled "Penal Justice in Brazil today: democratic discourse, authoritarian practice". The research sought to reflect on contemporary criminal justice policy, which has been guided by the widening of repression and the continued use of incarceration. Such policy, carried out in Brazil since the beginning of the 1985 "political opening" has adjusted itself to the liberal project that is also currently underway in the country, as well as in almost the entire Western capitalist world. As we can observe, Penal Justice, even during the execution of sentences, operates in authoritarian and exclusive ways, suppressing the rights guaranteed by law to those who have been sentenced and adopting extremely repressive forms as demonstrated by the extremely sparse benefits that it concedes. Thus, in Brazil, criminality has generally been responded through severe sentences, reflected in the absence of guarantees of constitutional rights and ample recourse to incarceration. In this vein, our contemporary democratic governments have frequently adopted a punitive stance that seeks to reaffirm the State's aptitudes for punishing and controlling criminality.
La transition démocratique brésilienne, toujours en cours, affronte des difficultés énormes pour y intégrer l'action pénale. Il y a plus, les bornes au processus de démocratisation établis dans l'action de ce secteur étatique nous renvoient à l'idée selon laquelle le champ juridique est devenu imperméable aux changements démocratiques. Même si le discours actuel chez les professionnels du Droit proclame la démocratisation de la Justice Pénale, on remarque, en fait, une forte résistance du champ juridique à assumer sa responsabilité politique à l'égard de la consolidation démocratique. Cet article présente des analyses et des conclusions formulées à partir des remarques sur la Justice Pénale brésilienne et qui ont originé le mémoire intitulé « Justice Pénale au Brésil actuel : discours démocratique - pratique autoritaire ». L'objectif de cette recherche fut de réflechir sur la politique criminelle contemporaine, tournée vers l'élargissement de la répression et au recours à l'incarcération. Une telle politique, menée au Brésil après l'ouverture politique survenue en 1985, s'adapte au projet libéral qui est aussi en cours dans le pays et dans presque tout l'occident capitaliste. Comme on le remarque, la Justice Pénale, même pendant l'accomplissement de la peine, opère de façon autoritaire et excluante, quand elle élimine au maximum les droits prévus par la loi à l'égard des criminels condamnés, en adoptant une attitude fort répressive, qui se revèle par les infimes pourcentages d'avantages accordés. Donc, au Brésil, les réponses à la criminalité souvent consistent en des peines sevères, traduites dans le manque de respect aux garanties constitutionnelles et dans le recours excessif à l'incarcération. Dans cette ligne, nos gouvernements démocratiques contemporains adoptentsouvent une position punitive visant réaffirmer la capacité de l'État de punir et contrôler la criminalité.